Aposentadoria por insalubridade​: como comprovar e garantir o direito do cliente

Descubra como comprovar a insalubridade e garantir a aposentadoria especial do seu cliente com base legal e estratégia previdenciária.

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A aposentadoria por insalubridade é considerada um dos maiores desafios no dia a dia de um advogado previdenciarista. 

Trata-se de um benefício, destinado a trabalhadores expostos a agentes nocivos à saúde, que sofreu alterações ao longo do tempo, em especial após a Emenda Constitucional Nº 103/2019, também conhecida como Reforma da Previdência.

Por isso, esse artigo pretende ser um guia prático, capaz de detalhar o funcionamento, a base legal, os requisitos e as formas de cálculo relacionadas à aposentadoria por insalubridade. 

Como funciona a aposentadoria especial por insalubridade​

A aposentadoria especial por insalubridade é uma modalidade de benefício previdenciário concedida a trabalhadores que exercem suas atividades em ambientes insalubres.

Ou seja, com exposição a agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física, podendo ser agentes de natureza química, física ou biológica.

A lógica do benefício é compensar o desgaste resultante do trabalho em condições adversas. 

Isso porque a lei presume que tal exposição reduz a expectativa de vida do trabalhador, justificando um tempo de contribuição menor para se aposentar, sem a incidência do fator previdenciário no cálculo do benefício, segundo regras anteriores à Reforma.

O tempo de exposição necessário para a concessão varia conforme o grau de nocividade do agente. A legislação estabelece três níveis:

  • 25 anos: para a maioria dos agentes nocivos, como ruído acima do limite de tolerância, agentes químicos listados em norma e agentes biológicos (contato com pacientes em hospitais, por exemplo).
  • 20 anos: para exposições de risco médio, como trabalhos em minas de superfície ou exposição a amianto.
  • 15 anos: para atividades de altíssimo risco, como o trabalho em frentes de produção de mineração subterrânea.

Mas é necessário comprovar a exposição para garantir o direito à aposentadoria especial. O que quer dizer que não basta que a atividade seja considerada insalubre para fins trabalhistas, com o recebimento do respectivo adicional. 

Ou seja, para fins previdenciários, é preciso demonstrar a exposição efetiva e habitual ao agente nocivo, por meio de documentos técnicos.

O principal documento é o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), emitido pela empresa com base no Laudo Técnico das Condições Ambientais de Trabalho (LTCAT). 

O PPP detalha as atividades exercidas pelo trabalhador e os agentes aos quais esteve exposto. 

Lei da aposentadoria por insalubridade​

A base legal da aposentadoria especial está na Lei Nº 8.213/9, chamada de Lei de Benefícios da Previdência Social, em seus artigos 57 e 58. 

A regulamentação detalhada, por sua vez, encontra-se no Decreto Nº 3.048/99, que aprova o Regulamento da Previdência Social. O Anexo IV deste decreto lista os agentes nocivos que dão direito ao benefício:

CÓDIGOTIPO DE AGENTEAGENTE NOCIVO / ATIVIDADETEMPO DE EXPOSIÇÃO
1.0.1QuímicoARSÊNIO e seus compostos25 Anos
1.0.2QuímicoASBESTOS (AMIANTO)20 Anos
1.0.3QuímicoBENZENO e seus compostos tóxicos25 Anos
1.0.4QuímicoBERÍLIO e seus compostos tóxicos25 Anos
1.0.5QuímicoBROMO e seus compostos tóxicos25 Anos
1.0.6QuímicoCÁDMIO e seus compostos tóxicos25 Anos
1.0.7QuímicoCARVÃO MINERAL e seus derivados25 Anos
1.0.8QuímicoCHUMBO e seus compostos tóxicos25 Anos
1.0.9QuímicoCLORO e seus compostos tóxicos25 Anos
1.0.10QuímicoCROMO e seus compostos tóxicos25 Anos
1.0.11QuímicoDISSULFETO DE CARBONO25 Anos
1.0.12QuímicoFÓSFORO e seus compostos tóxicos25 Anos
1.0.13QuímicoIODO25 Anos
1.0.14QuímicoMANGANÊS e seus compostos25 Anos
1.0.15QuímicoMERCÚRIO e seus compostos25 Anos
1.0.16QuímicoNÍQUEL e seus compostos tóxicos25 Anos
1.0.17QuímicoPETRÓLEO, XISTO BETUMINOSO, GÁS NATURAL e derivados25 Anos
1.0.18QuímicoSÍLICA livre25 Anos
1.0.19QuímicoSUBSTÂNCIAS CANCERÍGENAS (conforme listadas em normas)25 Anos
2.0.1FísicoRUÍDO (exposição a Níveis de Pressão Sonora Superiores a 85 dB(A))25 Anos
2.0.2FísicoVIBRAÇÕES (de mãos, braços e corpo inteiro)25 Anos
2.0.3FísicoRADIAÇÕES IONIZANTES (raios-X, extração de minerais radioativos)25 Anos
2.0.4FísicoTEMPERATURAS ANORMAIS (calor excessivo)25 Anos
2.0.5FísicoPRESSÃO ATMOSFÉRICA ANORMAL (trabalhos submersos, mergulho)25 Anos
3.0.1BiológicoMICROORGANISMOS E PARASITAS INFECCIOSOS(hospitais, laboratórios, lixo)25 Anos
4.0.0 (a)Associação de AgentesMINERAÇÃO SUBTERRÂNEA em frentes de produção15 Anos
4.0.0 (b)Associação de AgentesMINERAÇÃO SUBTERRÂNEA em afastamento das frentes de produção20 Anos
4.0.0 (c)Associação de AgentesMINERAÇÃO A CÉU ABERTO25 Anos

Porém, a interpretação de como se dá a prova da insalubridade foi alterada a longo do tempo, de acordo com reformas e mudanças na própria lei: 

  • Até 28 de abril de 1995: a comprovação da atividade especial era feita por enquadramento de categoria profissional. Bastava que a profissão do cliente estivesse listada nos decretos da época para que o tempo fosse considerado especial. Médicos, dentistas, engenheiros, motoristas de caminhão e metalúrgicos são exemplos de categorias enquadradas.
  • De 29 de abril de 1995 a 05 de março de 1997: a lei passou a exigir a comprovação da efetiva exposição a agentes nocivos, por meio de formulários específicos, como o SB-40 e o DSS-8030. O enquadramento por categoria profissional deixou de ser a regra.
  • A partir de 06 de março de 1997: a apresentação de Laudo Técnico das Condições Ambientais de Trabalho (LTCAT) tornou-se obrigatória para a comprovação da exposição. O PPP, instituído em 2004, consolidou as informações do LTCAT e dos antigos formulários, tornando-se o documento padrão.
  • A Reforma da Previdência (EC 103/2019): a Emenda Constitucional de 13 de novembro de 2019 alterou de forma substancial as regras da aposentadoria especial determinando a instituição de uma idade mínima para os novos segurados; a criação de uma regra de transição por pontos para quem já contribuía; a extinção da possibilidade de converter o tempo especial em tempo comum para períodos trabalhados após a reforma; e a alteração na forma de cálculo do valor do benefício.

Requisitos para aposentadoria especial por insalubridade

Com a Reforma da Previdência, os requisitos para acessar a aposentadoria especial foram divididos em três cenários distintos:

Direito Adquirido (para quem cumpriu os requisitos até 12/11/2019)

Trabalhadores que completaram o tempo mínimo de atividade especial antes da data da reforma têm direito adquirido às regras antigas. Neste caso, os requisitos são apenas:

  • 25, 20 ou 15 anos de atividade especial, a depender do agente nocivo.
  • Não há exigência de idade mínima ou de pontuação.
  • O cálculo do benefício é mais vantajoso, correspondendo a 100% da média dos 80% maiores salários de contribuição desde julho de 1994, sem fator previdenciário.

Regra de Transição (para quem já contribuía antes da reforma, mas não completou o tempo)

Para os trabalhadores que já estavam no sistema, mas não alcançaram o tempo necessário, foi criada uma regra de transição baseada em um sistema de pontos. A pontuação é a soma da idade do trabalhador com o seu tempo de atividade especial.

Os requisitos são:

  • 86 pontos (idade + tempo de contribuição) e, no mínimo, 25 anos de atividade especial.
  • 76 pontos (idade + tempo de contribuição) e, no mínimo, 20 anos de atividade especial.
  • 66 pontos (idade + tempo de contribuição) e, no mínimo, 15 anos de atividade especial.

O cálculo do benefício nesta regra já segue o novo modelo: 60% da média de todos os salários de contribuição a partir de julho de 1994, com acréscimo de 2% para cada ano que exceder vinte anos de contribuição, para homens, ou quinze anos, para mulheres, além de atividades de quinze e vinte anos.

Regra Permanente (para quem começou a contribuir após 13/11/2019)

Para os novos trabalhadores, a regra é mais rígida e combina tempo de atividade especial com uma idade mínima.

Os requisitos são:

  • 60 anos de idade e 25 anos de atividade especial.
  • 58 anos de idade e 20 anos de atividade especial.
  • 55 anos de idade e 15 anos de atividade especial.

Como calcular insalubridade na aposentadoria por tempo de contribuição

Com a Reforma da Previdência houve uma mudança significativa na utilização do tempo de atividade especial para fins de aposentadoria comum. 

A principal alteração foi a extinção da conversão de tempo especial em comum para os períodos trabalhados a partir de 13 de novembro de 2019.

Agora, o tempo de trabalho em condições insalubres exercido após a reforma conta apenas como tempo de contribuição regular. 

Ou seja, “um por um”, sem qualquer acréscimo, não sendo mais possível “aumentar” o tempo de contribuição por meio da conversão.

Contudo, o direito à conversão para os períodos trabalhados até 12 de novembro de 2019 foi preservado, o que permite otimizar a aposentadoria por tempo de contribuição do trabalhador.

Para isso, é preciso realizar uma análise minuciosa do histórico de trabalho do segurado para identificar e comprovar todos os períodos especiais anteriores à reforma. 

Depois disso é só aplicar os multiplicadores pelo valor do período identificado. Os multiplicadores são: 

  • Para homens: multiplica-se o tempo especial por 1,4.
  • Para mulheres: multiplica-se o tempo especial por 1,2.

Aplicação prática no cenário pós-reforma:

Mas à época em que vivemos, é comum haverem clientes que trabalharam e contribuíram antes de 2019, e seguem trabalhando e contribuindo. Nesses casos, é preciso considerar: 

  • Tempo de contribuição comum: períodos sem exposição a agentes nocivos.
  • Tempo especial pré-reforma convertido: o resultado da multiplicação do tempo especial trabalhado até 12/11/2019 pelo fator correspondente.
  • Tempo especial pós-reforma sem conversão: o tempo trabalhado em condições especiais após a reforma, contado de forma simples.

Por exemplo:  uma cliente possui 28 anos de contribuição total em 2024. Desse total, dez anos foram trabalhados como enfermeira em hospital antes de 2019, e dois anos na mesma função após 2019.

O cálculo que o advogado deve fazer é:

  • Tempo comum: 28 anos (total) – 12 anos (especial) = 16 anos.
  • Conversão do tempo especial pré-reforma: 10 anos x 1,2 (fator mulher) = 12 anos de tempo de contribuição.
  • Tempo especial pós-reforma: 2 anos (contados sem conversão).

Assim, o cálculo do tempo total para aposentadoria comum é: 16 anos (comum) + 12 anos (convertido) + 2 anos (pós-reforma) = 30 anos de tempo de contribuição.

Este resultado de 30 anos deve ser  utilizado para verificar se a cliente se enquadra em alguma regra de transição. 

Sem a conversão do período antigo, ela teria apenas 28 anos, o que poderia inviabilizar ou postergar seu direito ao benefício. 

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