O ônus da prova talvez seja o conceito legal mais difundido na sabedoria popular. Implica no fato de que quem acusa deve provar a culpa do acusado. Quantos filmes já assistimos em que o vilão é sabidamente culpado, mas fica impune por ninguém conseguir provar?
Porém, no Brasil, em casos específicos, é admitida a inversão do ônus da prova. Em que casos isso é aplicável, é o que vamos ver neste artigo:
O que é inversão do ônus da prova?
No Brasil, o princípio de inversão do ônus da prova está ligado ao Direito do Consumidor. Trata-se de um dos principais mecanismos de defesa do consumidor tendo em vista a facilitação, ou ao menos a viabilidade de seu acesso à justiça.
Isso porque o ônus da prova parte do princípio de que quem faz uma alegação (ou até mesmo acusação) deve garanti-la através da apresentação de provas.
O Art. 319 do novo Código de Processo Civil (CDC) deixa expresso que toda petição inicial deve conter provas que demonstram a veracidade dos fatos alegados pela parte proponente da ação ou processo.
Já no que diz respeito ao Direito do Consumidor, o CDC presume a dificuldade do consumidor, que se considera prejudicado, em levantar os dados e informações comprobatórias por falta de acesso a elas.
Assim, a parte acusada é que precisa, nesses casos, apresentar provas contrárias ao que foi alegado, caracterizando a inversão do ônus da prova.
A inversão do ônus da prova, porém, não é automática. Ela ocorre quando o juiz identifica verossimilhança das alegações ou hipossuficiência técnica do consumidor. E é sobre esses dois preceitos que veremos a seguir.
Inversão do ônus da prova no CDC
Por se tratar de um princípio ligado ao direito consumerista, o Código de Defesa do Consumidor (CDC) é que trata especificamente do princípio da inversão do ônus da prova.
Ele diz que uma relação de consumo tem como principal característica a hipossuficiência da parte consumidora. Mas é preciso ter cuidado: o primeiro impulso, ao buscar entender isso, é acreditar que se trata de uma hipossuficiência econômica. Mas não se trata disso.
A hipossuficiência tratada aqui é muito mais técnica e/ou de conhecimento, sendo estabelecida uma diferença nas relações de poder entre quem comercializa um produto e quem o compra.
Assim, como já vimos, ao se deparar com as alegações do consumidor autor da ação, o juiz está apto a inverter o ônus da prova quando fica evidente a hipossuficiência do mesmo, ou quando entender que há verossimilhança no que foi alegado.
Mas e a verossimilhança? A verossimilhança é um conceito usado em diversas áreas do Direito. Significa que as alegações do autor da ação precisam fazer sentido, precisam ter algum nexo.
Ou seja, o juiz, munido de sua experiência, precisa entender que é possível sim, que aquilo tenha acontecido. E, quando se trata do CDC, ao perceber que a alegação do consumidor faz sentido, e entender que há hipossuficiência, ele autoriza a inversão do ônus da prova.
Hipossuficiência ≠ Vulnerabilidade
Como já falamos, um dos requisitos para que haja inversão do ônus da prova é a hipossuficiência do consumidor, ou seja, que ele não tenha condições de provar aquilo que alega devido a questões técnicas, econômicas, ou de informações.
A hipossuficiência técnica se dá através de questões muito específicas, como o fato do consumidor não ter o conhecimento de que determinado componente eletrônico utilizado é inferior ou insuficiente; ou regras que devem ser observadas em contratos bancários.
Já a hipossuficiência econômica não está ligada ao poder econômico do consumidor, ou mesmo à diferença que há entre seu poder econômico e o da empresa, mas sim ao fato de que produzir determinadas provas (através de perícias, por exemplo) pode ser muito caro.
E a hipossuficiência informacional (ou de informações) diz respeito ao acesso que o consumidor tem, em condições normais, às informações que necessita para fundamentar sua alegação.
Pedido de inversão do ônus da prova
Como dito anteriormente, a inversão do ônus da prova acontece a partir da percepção do juiz de que há verossimilhança das alegações e hipossuficiência do consumidor. Ela não é automática, mas, ao mesmo tempo, não precisa partir do autor da ação, através de pedido.
Apesar disso, a fim de “garantir” que a inversão do ônus da prova ocorra, é sempre bom registrar tal requerimento na petição inicial.
Anos atrás, os juízes analisavam pedidos de inversão do ônus da prova já na sentença. Porém, o Superior Tribunal de Justiça pacificou o entendimento de que se trata de uma regra de instrução e, logo, deve ser analisada no início do processo.
Assim, caso o juiz não venha a analisar a distribuição do ônus da prova na decisão do saneamento, é preciso apresentar uma manifestação com pedido de esclarecimento. Caso a omissão persista, deve-se ingressar com um agravo de instrumento.
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