Discussões sobre o regime de guarda de menores e incapazes são cada vez mais comuns e difundidos entre as famílias brasileiras.
Afinal, de acordo com o censo do IBGE de 2022, mais de 10 milhões de lares são “monoparentais”, ou seja, lares onde crianças e adolescentes vivem apenas com o pai ou a mãe.
E, embora a estatística abrigue viúvos(as) e genitores que nunca viveram juntos, é razoável dizer que a maioria desses lares é derivado de um divórcio ou separação e possui estipulado um regime de guarda parental.
Mas, o fato de ser considerado um lar, como já dissemos, “monoparental” significa que o regime de guarda adotado é o unilateral? Não necessariamente.
Por exemplo: uma criança que reside com a mãe e visita o pai em fins de semana alternados, para muitos, inclusive no meio jurídico, configura uma guarda unilateral.
Mas a verdadeira essência da guarda unilateral não está na definição do lar de referência da criança, e sim na centralização do poder de decisão sobre sua vida em apenas um dos genitores.
E, apesar do “spoiler” recém dado, este artigo se propõe a explicar e desmistificar o regime de guarda unilateral, incluindo seus fundamentos legais e estratégias a serem tomadas quando ela se faz necessária em meio a uma disputa familiar.
O que é guarda unilateral
A guarda unilateral é uma modalidade de custódia atribuída a apenas um dos genitores ou a alguém apto a substituí-lo.
Nela, o guardião detém, de forma exclusiva, a responsabilidade pelas decisões sobre a vida do filho. Desde questões como a escolha da escola e autorizações para viagens, a definição de tratamentos médicos e orientação religiosa.
A concessão da guarda unilateral,porém, é considerada uma medida de exceção. Sendo o princípio norteador de qualquer decisão judicial sobre o tema o do melhor interesse da criança ou adolescente.
Isso, no entanto, não significa que o genitor não detentor da guarda permaneça alheio ao crescimento de seu filho.
Apesar da guarda unilateral, a lei lhe assegura o direito/dever de convivência e também de fiscalização.
Quer dizer que ele não apenas pode, mas deve supervisionar os interesses do filho. O que inclui a solicitação de informações e prestações de contas, tanto em assuntos de natureza educacional quanto de saúde.
Já a convivência, apesar de direito/dever assegurado, é regulamentada pelo juiz responsável e varia de caso a caso, tendo em vista a garantia e manutenção dos vínculos afetivos.
Diferença entre guarda compartilhada e unilateral
Antes de estabelecer a diferença entre os dois regimes, é importante destacar que, desde a promulgação da Lei Nº 13.058/2014, a guarda compartilhada tornou-se a regra no ordenamento jurídico brasileiro. Mesmo quando não há consenso entre os pais.
A primeira diferença está no tempo de convívio com os filhos, que, na guarda compartilhada deve ser dividido de forma equilibrada.
O que não significa necessariamente dividir o tempo de convívio ou de “guarda”de forma matemática, como em caso de “guarda alternada”.
O ponto central da guarda compartilhada é a responsabilização conjunta e o exercício em comum dos direitos e deveres parentais.
Ou seja, as decisões importantes sobre a vida do menor são tomadas pelos genitores, em conjunto.
Nós temos aqui no JusBlog um artigo inteiramente voltado à guarda compartilhada, e que também explica a diferença entre ela e a guarda alternada e a guarda unilateral. Confira:
Guarda compartilhada: práticas recomendadas para a implementação eficaz
Na guarda unilateral, como já vimos, a tomada de decisões é centralizada em um único genitor e a outra parte exerce um papel fiscalizador e de convivência, apenas.
Isso significa que a principal diferença está, portanto, não na residência da criança ou adolescente, e sim no poder decisório.
Para melhor entendimento, criamos uma tabela com as principais diferenças entre os dois regimes:
Característica | Guarda Unilateral | Guarda Compartilhada |
Poder Decisório | Centralizado em um genitor. | Conjunto, exercido por ambos os genitores. |
Residência | Fixada com o genitor guardião. | Fixada uma residência principal de referência. |
Convivência | Regulamentada judicialmente para o não guardião. | Divisão equilibrada do tempo de convivência. |
Aplicação | Exceção. Aplicada quando um genitor é inapto ou se opõe. | Regra geral, mesmo sem consenso entre as partes. |
Fundamento Legal | Art. 1.583, § 1º, do Código Civil. | Art. 1.584, § 2º, do Código Civil. |
Importante: a opção pela guarda unilateral ocorre quando o juiz verifica que a aplicação do modelo compartilhado pode trazer mais prejuízos do que benefícios ao menor.
Isso acontece, por exemplo, em casos de grave conflito entre os pais, violência doméstica, abuso de substâncias (lícitas ou ilícitas) ou ainda quando um dos genitores declarar expressamente o desinteresse em exercer a guarda.
Desvantagens da guarda unilateral
Apesar de ser uma solução necessária em certos contextos, a guarda unilateral apresenta desvantagens que devem ser consideradas.
Para a criança ou adolescente, a principal desvantagem é a possível diminuição do convívio com o genitor não guardião.
Isso pode levar a um distanciamento afetivo e, em casos extremos, acaba por fomentar um ambiente propício para a alienação parental.
Além disso, o menor pode se sentir privado de uma figura de referência importante para seu desenvolvimento, desenvolvendo complicações psicossomáticas na fase adulta, ou até mesmo na infância e adolescência.
Já para o genitor não guardião, a desvantagem se dá na exclusão do processo decisório cotidiano.
Mesmo com o direito de fiscalização, a sua influência sobre as escolhas cruciais da vida do filho é limitada, gerando sentimentos de frustração e impotência.
E para o genitor guardião, a sobrecarga é dada como a principal consequência negativa. A responsabilidade exclusiva por todas as decisões, somada aos cuidados diários, pode gerar um nível elevado de estresse e esgotamento físico e emocional.
Além disso, do ponto de vista processual, a disputa pela guarda unilateral tende a ser mais litigiosa e desgastante.
A necessidade de provar a inaptidão do outro genitor intensifica o conflito, o que pode alongar o litígio e causar danos emocionais a todos os envolvidos, sobretudo aos filhos.
Ação de guarda unilateral
A proposta de uma ação de guarda unilateral exige aquilo que é chamado de “base probatória”. Ou seja, deve se demonstrar, de forma inequívoca, que a guarda compartilhada não atende ao melhor interesse do menor.
As provas devem ser consistentes para convencer o juízo da incapacidade ou do desinteresse do outro genitor em exercer a guarda de forma compartilhada. São exemplos de provas eficazes:
- Estudo psicossocial: requerer a realização de estudo por equipe técnica do juízo é uma medida quase obrigatória. O laudo de assistentes sociais e psicólogos tem grande peso na decisão judicial.
- Prova documental: boletins de ocorrência (em casos de violência), relatórios escolares que indiquem negligência, comprovantes de tratamento para dependência química, trocas de mensagens que demonstrem desinteresse ou ameaças.
- Prova testemunhal: o depoimento de pessoas que presenciam a rotina da criança e a dinâmica familiar podem corroborar os fatos alegados na petição inicial.
- Tutela de urgência: em situações de risco iminente à integridade física ou psicológica do menor, se faz necessário o pedido de tutela provisória de urgência para a concessão da guarda unilateral liminar. A petição deve demonstrar a probabilidade do direito (fumus boni iuris) e o perigo de dano (periculum in mora).
Modelo de ação de guarda unilateral
Como costumamos frisar naqueles artigos finalizados com modelos de documentos, a estrutura abaixo deve servir como referência para adaptação às especificidades de cada caso:
EXCELENTÍSSIMO(A) SENHOR(A) DOUTOR(A) JUIZ(A) DE DIREITO DA ____ VARA DE FAMÍLIA E SUCESSÕES DA COMARCA DE [CIDADE/UF]
[NOME COMPLETO DO(A) REQUERENTE], [nacionalidade], [estado civil], [profissão], portador(a) do RG nº [número] e inscrito(a) no CPF sob o nº [número], residente e domiciliado(a) na [endereço completo com CEP], endereço eletrônico [e-mail], por seu advogado que esta subscreve (procuração anexa), com escritório profissional na [endereço do escritório], onde recebe intimações, vem, respeitosamente, perante Vossa Excelência, propor a presente
AÇÃO DE GUARDA UNILATERAL C/C REGULAMENTAÇÃO DE CONVIVÊNCIA E ALIMENTOS (COM PEDIDO DE TUTELA DE URGÊNCIA)
em face de [NOME COMPLETO DO(A) REQUERIDO(A)], [nacionalidade], [estado civil], [profissão], portador(a) do RG nº [número] e inscrito(a) no CPF sob o nº [número], residente e domiciliado(a) na [endereço completo com CEP], endereço eletrônico [e-mail], pelos fatos e fundamentos a seguir expostos.
1. DA GRATUIDADE DE JUSTIÇA
O(A) Requerente declara, sob as penas da lei, não possuir condições financeiras de arcar com as custas processuais e honorários advocatícios sem prejuízo do seu próprio sustento e de sua família, conforme declaração de hipossuficiência anexa. Requer, assim, os benefícios da gratuidade de justiça, nos termos do art. 98 do CPC e da Lei nº 1.060/50.
2. DOS FATOS
O(A) Requerente e o(a) Requerido(a) mantiveram um relacionamento do qual nasceu o(a) menor [NOME COMPLETO DO(A) FILHO(A)], atualmente com [idade] anos, conforme certidão de nascimento anexa.
[Neste ponto, narrar de forma objetiva e cronológica os fatos que levaram à separação e, principalmente, os motivos que tornam a guarda compartilhada inviável ou prejudicial ao menor. Exemplos: histórico de negligência, abuso de álcool/drogas, violência, desinteresse manifesto do outro genitor, etc. Apresentar os fatos de forma a demonstrar que a guarda unilateral é a única medida que protege o melhor interesse da criança.]
3. DO DIREITO
3.1. Da Guarda Unilateral
O ordenamento jurídico brasileiro, em que pese priorizar a guarda compartilhada, prevê a modalidade unilateral como exceção necessária à proteção do menor, conforme dispõe o art. 1.583, § 1º, e o art. 1.584, II, do Código Civil.
No presente caso, os fatos narrados demonstram de forma clara que a aplicação da regra da guarda compartilhada seria danosa ao desenvolvimento sadio do(a) infante. [Desenvolver a argumentação jurídica, conectando os fatos às hipóteses legais que autorizam a guarda unilateral, sempre com foco no princípio do melhor interesse da criança – art. 227 da CF].
3.2. Da Tutela de Urgência (se aplicável)
Conforme o art. 300 do CPC, a tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano. A probabilidade do direito está consubstanciada nos documentos e fatos aqui expostos. O perigo de dano reside no [descrever o risco concreto e imediato para a criança, como risco à integridade física, psicológica, abandono, etc.].
Assim, requer-se a concessão liminar da guarda unilateral provisória ao(à) Requerente.
4. DOS PEDIDOS
Diante do exposto, requer a Vossa Excelência:
a) A concessão dos benefícios da gratuidade de justiça;
b) O deferimento da tutela provisória de urgência, inaudita altera pars, para conceder a guarda unilateral provisória do(a) menor [Nome do Filho(a)] ao(à) Requerente;
c) A citação do(a) Requerido(a) para, querendo, apresentar contestação no prazo legal;
d) A intimação do ilustre representante do Ministério Público para intervir no feito;
e) A procedência total da ação para confirmar a tutela de urgência e decretar a guarda unilateral definitiva do(a) menor em favor do(a) Requerente;
f) A regulamentação do direito de convivência do(a) Requerido(a) nos seguintes termos: [sugerir um regime de visitas];
g) A fixação de alimentos provisórios e, ao final, definitivos, em favor do(a) menor no valor de [valor ou percentual] dos rendimentos do(a) Requerido(a);
h) A condenação do(a) Requerido(a) ao pagamento das custas processuais e honorários de sucumbência.
Protesta provar o alegado por todos os meios de prova em direito admitidos, em especial a prova documental, testemunhal e a realização de estudo psicossocial.
Dá-se à causa o valor de R$ [valor por estimativa, geralmente 12 vezes o valor da pensão alimentícia pleiteada].
Termos em que,
Pede deferimento.
[Local], [data].
[Nome do Advogado]
[OAB/UF nº]
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