As audiências de conciliação são consideradas vitais para o bom andamento do sistema judiciário brasileiro. Tem como objetivo oferecer às partes a oportunidade de acordo, de forma ágil e com menor desgaste emocional e financeiro possível.
Além disso, elas foram criadas com o intuito de desobstruir o judiciário, impedindo que milhões de causas potencialmente solucionadas através de acordo cheguem à juízo.
Em 2023, foram 5,66 milhões de audiências de conciliação e mediação no Brasil, conforme dados do Painel de Resolução Consensual de Conflitos do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
O que é audiência de conciliação
A audiência de conciliação é um ato processual conduzido por um conciliador ou mediador, e, em alguns casos, pelo próprio juiz.
Sua finalidade é estimular o diálogo entre as partes para que elas, de forma autônoma, construam uma solução para o conflito existente. Diferente do juiz, o conciliador não impõe uma decisão: ele facilita a comunicação e a negociação.
Trata-se de um mecanismo que busca a pacificação social e a celeridade processual, podendo a tentativa de acordo ocorrer em diversas fases do processo e em diferentes esferas da justiça.
O Código de Processo Civil (CPC), inclusive, incentiva a autocomposição no Artigo 3º, §2º e §3º:
Art. 3º. “(…)
§ 2º O Estado promoverá, sempre que possível, a solução consensual dos conflitos.
§ 3º A conciliação, a mediação e outros métodos de solução consensual de conflitos deverão ser estimulados por juízes, advogados, defensores públicos e membros do Ministério Público, inclusive no curso do processo judicial.”
Já no âmbito dos Juizados Especiais Cíveis, regidos pela Lei Nº 9.099/95, a conciliação é etapa obrigatória e fundamental, dada a natureza simplificada e célere desses órgãos.
A ideia central é que as próprias partes, com auxílio de um terceiro imparcial, encontrem a melhor saída para a disputa, o que tende a gerar maior satisfação e cumprimento do que foi acordado.
Como funciona uma audiência de conciliação
O funcionamento da audiência de conciliação começa pela designação de data e hora pelo juízo.
As partes são intimadas a comparecer, pessoalmente ou representadas por preposto com poderes para negociar e transigir.
Isso porque a presença de advogados é obrigatória na justiça comum, conforme o CPC, mas facultativa nos Juizados Especiais Cíveis para causas de até vinte salários mínimos.
No dia da audiência, o conciliador ou mediador inicia a sessão. Apresenta-se, explica o propósito do encontro e as regras de condução.
Ele deve garantir que as partes tenham oportunidade igual de expor suas perspectivas sobre o conflito. O conciliador utiliza técnicas de escuta ativa e negociação para auxiliar as partes a identificar os interesses subjacentes às suas posições.
Se as partes chegarem a um consenso, o que foi acordado é reduzido a termo. Esse documento é assinado pelas partes, seus advogados (quando há) e pelo conciliador.
Depois, o juiz homologa o acordo por sentença, conferindo a ele força de título executivo judicial. Isso significa que, em caso de descumprimento, a parte prejudicada pode requerer a execução forçada do acordo nos próprios autos.
Mas e no caso de não haver acordo? Caso não haja acordo, a audiência é encerrada sem uma solução consensual. O processo, então, segue seu curso normal, no procedimento comum, abrindo-se o prazo para apresentação de contestação pelo réu.
Nos Juizados Especiais, dependendo da organização local, pode-se seguir para a audiência de instrução e julgamento na mesma data ou em data posterior.
O Artigo 334 do Código de Processo é inteiramente voltado a detalhar o procedimento:
Art. 334. “Se a petição inicial preencher os requisitos essenciais e não for o caso de improcedência liminar do pedido, o juiz designará audiência de conciliação ou de mediação com antecedência mínima de 30 (trinta) dias, devendo ser citado o réu com pelo menos 20 (vinte) dias de antecedência.
§ 1º O conciliador ou mediador, onde houver, atuará necessariamente na audiência de conciliação ou de mediação, observadas as respectivas atribuições, que poderão ser definidas em lei de organização judiciária.
§ 2º Poderá haver mais de uma sessão destinada à conciliação e à mediação, não podendo exceder a 2 (dois) meses da data de realização da primeira sessão, desde que necessárias à composição das partes.
§ 3º A intimação do autor para a audiência será feita na pessoa de seu advogado.
§ 4º A audiência não será realizada:
I – se ambas as partes manifestarem, expressamente, desinteresse na composição consensual;
II – quando não se admitir a autocomposição.
§ 5º O autor deverá indicar, na petição inicial, seu desinteresse na autocomposição, e o réu deverá fazê-lo, por petição, apresentada com 10 (dez) dias de antecedência, contados da data da audiência.
§ 6º Havendo litisconsórcio, o desinteresse na realização da audiência deve ser manifestado por todos os litisconsortes.
§ 7º A audiência de conciliação ou de mediação pode realizar-se por meio eletrônico, nos termos da lei.
§ 8º O não comparecimento injustificado do autor ou do réu à audiência de conciliação é considerado ato atentatório à dignidade da justiça e será sancionado com multa de até dois por cento da vantagem econômica pretendida ou do valor da causa, revertida em favor da União ou do Estado.
§ 9º As partes devem estar acompanhadas por seus advogados ou defensores públicos.
§ 10. A parte poderá constituir representante, por meio de procuração específica, com poderes para negociar e transigir.
§ 11. A autocomposição obtida será reduzida a termo e homologada por sentença.
§ 12. A pauta das audiências de conciliação ou de mediação será organizada de modo a respeitar o intervalo mínimo de 20 (vinte) minutos entre o início de uma e o início da seguinte.”
Não comparecimento do réu em audiência de conciliação no juizado especial
Se o réu, devidamente citado ou intimado, não comparecer à sessão de conciliação ou à audiência de instrução e julgamento, deixando de apresentar justificativa plausível para sua ausência, opera-se à revelia.
A Lei Nº 9.099/95, que rege esses juizados, estabelece consequências diretas para a ausência injustificada, em especial do réu:
Art. 20. “Não comparecendo o demandado à sessão de conciliação ou à audiência de instrução e julgamento, reputar-se-ão verdadeiros os fatos alegados no pedido inicial, salvo se o contrário resultar da convicção do Juiz.”
O juiz pode, porém, com base nas provas já existentes nos autos, afastar os efeitos da revelia se entender que os fatos narrados pelo autor não condizem com a realidade ou se o direito pleiteado não encontra amparo legal.
É importante notar que, mesmo “revel”, o réu pode intervir no processo no estado em que se encontrar. Contudo, perde a oportunidade de contestar especificamente os fatos e de produzir provas em seu favor sobre a matéria fática alegada pelo autor.
Exceto, claro, aquelas que o juiz determinar de ofício ou as que puderem ser conhecidas a qualquer tempo. A ausência do autor, por sua vez, acarreta a extinção do processo sem resolução do mérito, e o mesmo pode ser condenado ao pagamento das custas.
Audiência de conciliação: instrução e julgamento
A expressão “audiência de conciliação, instrução e julgamento” refere-se, comumente, ao procedimento adotado nos Juizados Especiais Cíveis.
A busca por celeridade e simplicidade dos JECs fazem com que a Lei Nº 9.099/95 preveja a possibilidade de concentrar a audiência de conciliação, instrução e julgamento em uma única sessão, chamada de “audiência una”.
Nesse formato, a audiência inicia com a tentativa de conciliação. Se as partes chegarem a um acordo, este é homologado e o processo se encerra. Caso a conciliação seja infrutífera, o processo segue imediatamente, na mesma sessão, para a fase de instrução.
Na instrução, o réu apresenta sua contestação, que pode ser oral ou escrita. Em seguida, são ouvidas as partes (depoimento pessoal) e as testemunhas arroladas.
Também são analisadas as provas documentais e periciais, quando houver e se compatíveis com o rito sumaríssimo. Concluída a instrução, o juiz profere a sentença.
O Artigo 27 da Lei Nº 9.099/95 estabelece:
Art. 27. “Não instituído o juízo arbitral, proceder-se-á imediatamente à audiência de instrução e julgamento, desde que não resulte prejuízo para a defesa.
Parágrafo único. Não sendo possível a sua realização imediata, será a audiência designada para um dos quinze dias subseqüentes, cientes, desde logo, as partes e testemunhas eventualmente presentes.”
No procedimento comum do Código de Processo Civil, a audiência de conciliação ou mediação é uma etapa preliminar.
Quando sem acordo, o processo segue para a fase de saneamento e, posteriormente, para a audiência de instrução e julgamento onde serão produzidas as provas orais e, ao final, proferida a sentença.
Contudo, nada impede que o juiz, no início da audiência de instrução e julgamento no rito comum, tente novamente conciliar as partes, de acordo com o Art. 139, V, do CPC.
Art. 139. “O juiz dirigirá o processo conforme as disposições deste Código, incumbindo-lhe:
(…)
V – promover, a qualquer tempo, a autocomposição, preferencialmente com auxílio de conciliadores e mediadores judiciais;”
Motivos que justificam ausência em audiência de conciliação
O comparecimento à audiência de conciliação é um dever processual. A ausência injustificada pode trazer consequências negativas para a parte faltosa, como multa, por exemplo.
Nos Juizados Especiais Cíveis, como já vimos, a ausência pode acarretar a revelia para o réu, ou ainda a extinção do processo para o autor.
Mas existem situações que podem justificar a ausência. Em geral, são considerados motivos justos aqueles decorrentes de força maior ou caso fortuito, que impedem o comparecimento da parte ou de seu representante legal.
Confira alguns exemplos comuns de justificativas aceitas pelos tribunais:
- Doença grave e repentina: a parte deve apresentar atestado médico detalhado, que comprove a impossibilidade de locomoção ou comparecimento no dia e hora da audiência.
- Falecimento de familiar próximo: comprovação por meio de certidão de óbito.
- Acidente: boletim de ocorrência ou laudo médico que ateste a impossibilidade.
- Compromissos inadiáveis e imprevisíveis: como viagens a trabalho urgentes, desde que devidamente comprovadas e comunicadas com antecedência, se possível.
- Problemas de transporte público graves e generalizados: como greves que paralisem totalmente o sistema de transporte, comprovadas por notícias ou comunicados oficiais.
É fundamental que a parte impossibilitada de comparecer comunique o juízo com a maior antecedência possível, apresentando os documentos que comprovem o impedimento.
O juiz analisará a justificativa e decidirá sobre sua aceitação, podendo redesignar a audiência ou aplicar as sanções cabíveis caso a ausência seja considerada injustificada.
Além disso, existe a alternativa da parte constituir um representante por meio de procuração específica, com poderes para negociar e transigir.
Prazo para contestação após audiência de conciliação
A contagem do prazo para apresentação da contestação, por parte do réu, depende do resultado ou da ocorrência da audiência de conciliação ou mediação.
O Art. 335 do CPC estabelece as regras para o início da contagem do prazo de quinze dias úteis para o réu contestar. Confira:
Art. 335. “O réu poderá oferecer contestação, por petição, no prazo de 15 (quinze) dias, cujo termo inicial será a data:
I – da audiência de conciliação ou de mediação, ou da última sessão de conciliação, quando qualquer parte não comparecer ou, comparecendo, não houver autocomposição;
II – do protocolo do pedido de cancelamento da audiência de conciliação ou de mediação apresentado pelo réu, quando ocorrer a hipótese do art. 334, § 4º, inciso I;
III – prevista no art. 231, de acordo com o modo como foi feita a citação, nos demais casos.
§ 1º No caso de litisconsórcio passivo, ocorrendo a hipótese do art. 334, § 6º, o termo inicial previsto no inciso II será, para cada um dos réus, a data de apresentação de seu respectivo pedido de cancelamento da audiência.
§ 2º Quando ocorrer a hipótese do art. 334, § 4º, inciso II, havendo litisconsórcio passivo e o autor desistir da ação em relação a réu ainda não citado, o prazo para contestação correrá da data de intimação da decisão que homologar a desistência.”
Portanto, se a audiência de conciliação for realizada e não houver acordo, ou se uma das partes não comparecer, o prazo de quinze dias para contestar começa a fluir a partir da data dessa audiência.
Se o réu manifestar, em petição, seu desinteresse na audiência, o prazo para contestação inicia na data do protocolo do pedido de cancelamento feito pelo réu.
E nos Juizados Especiais Cíveis, a contestação deve ser apresentada na própria audiência de instrução e julgamento, que pode ocorrer logo após uma tentativa de conciliação infrutífera, ou em data posterior designada.
Isso fica claro no Art. 30 da Lei Nº 9.099/95:
Art. 30. “A contestação, que será oral ou escrita, conterá toda matéria de defesa, exceto arguição de suspeição ou impedimento do Juiz, que se processará na forma da legislação em vigor.”
Sendo assim, nos JECs, não há um prazo de “X dias após a audiência de conciliação” para contestar. A defesa é apresentada na audiência subsequente designada para instrução, caso a conciliação não tenha êxito.
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