Trabalhadores em uma fábrica, posando para foto, de braços cruzados

Terceirização do trabalho: como garantir a conformidade legal

Saiba como funciona a terceirização do trabalho, os direitos do trabalhador terceirizado e como garantir a conformidade legal nos contratos.

Compartilhe esse post

A terceirização é uma prática cada vez mais comum no mercado de trabalho brasileiro. Através dela, as empresas buscam aumentar a eficiência com redução de custos e flexibilidade operacional. Porém, trata-se de uma “estratégia” que exige cuidados jurídicos.

Isso porque a legislação brasileira impõe limites e condições específicas para a terceirização. E quebrar ou ignorar essas regras pode acarretar prejuízos significativos, como autuações, multas e condenações trabalhistas.

Por isso, neste artigo, vamos abordar o conceito de trabalho terceirizado; os direitos envolvidos; e também os impactos da Reforma Trabalhista; além das situações em que a terceirização é proibida; e os cuidados necessários com os contratos.

O que é trabalho terceirizado

O trabalho terceirizado é uma forma de contratação indireta de mão de obra. Nesse modelo de contratação, uma empresa contrata outra para fornecer trabalhadores que prestam serviços em seu benefício.

A empresa contratada é chamada de prestadora de serviços. Já a empresa que recebe o serviço é considerada a tomadora. E o trabalhador terceirizado tem vínculo empregatício com a prestadora, e não com a tomadora.

Esse modelo é regulado pela Lei Nº 6.019/1974, que trata do trabalho temporário e terceirizado. Ela foi alterada pela Lei Nº 13.429/2017, que ampliou as possibilidades de terceirização no Brasil.

O artigo da Lei Nº 6.019/1974 responsável por conceituar o trabalho terceirizado é o 4º-A:

Art. 4-A. “Considera-se prestação de serviços a terceiros a transferência feita pela contratante da execução de quaisquer de suas atividades à pessoa jurídica de direito privado”.

Com a nova redação, passou a ser permitida a terceirização não apenas das atividades-meio, mas também da atividade-fim. Isso significa que funções essenciais ao objeto social da empresa podem ser terceirizadas.

Mas, apesar da ampliação, a lei mantém exigências e responsabilidades claras. A tomadora continua responsável por garantir condições adequadas de saúde, segurança e dignidade ao trabalhador terceirizado.

Quais direitos o trabalhador terceirizado não tem

O trabalhador terceirizado tem garantidos todos os direitos trabalhistas previstos na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), como salário mínimo, férias, 13º salário, FGTS e descanso semanal remunerado.

Porém, como seu vínculo é com a prestadora, ele não tem acesso a direitos e benefícios internos da tomadora de serviços, a menos que sejam estendidos voluntariamente.

Isso inclui programas de participação nos lucros, bônus corporativos, plano de saúde, progressões salariais por mérito ou tempo de casa e outros benefícios concedidos apenas a funcionários diretos.

Além disso, o terceirizado não pode ser incluído na estrutura hierárquica da empresa tomadora. Ele não está sujeito a ordens diretas de supervisores da tomadora nem deve ter sua jornada controlada por ela.

Caso haja pessoalidade, habitualidade e subordinação direta à tomadora, há risco de reconhecimento de vínculo empregatício, conforme jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho (TST).

Nesses casos, a empresa tomadora pode ser condenada a pagar verbas trabalhistas integrais, com base nos artigos 2º e 3º da CLT, que são responsáveis por definir a relação de emprego e seus elementos caracterizadores.

Art. 2º – “Considera-se empregador a empresa, individual ou coletiva, que, assumindo os riscos da atividade econômica, admite, assalaria e dirige a prestação pessoal de serviço.”

Art. 3º – “Considera-se empregado toda pessoa física que prestar serviços de natureza não eventual a empregador, sob a dependência deste e mediante salário.”

Trabalho terceirizado e a Reforma Trabalhista

A Reforma Trabalhista de 2017, instituída pela Lei Nº 13.467/17, representa uma das maiores transformações já realizadas na legislação trabalhista brasileira desde a promulgação da CLT.

Uma das mudanças mais significativas está relacionada justamente à terceirização, consolidando mudanças iniciadas pela Lei Nº 13.429/17 e permitindo que empresas contratassem serviços terceirizados em qualquer atividade, inclusive a principal.

Antes disso, a jurisprudência seguia a Súmula 331 do TST, que só admitia a terceirização de atividades-meio, como vigilância e limpeza. 

O artigo 4º-C da Lei Nº 6.019/74, incluído pela reforma, prevê: 

Art. 4º-C. “O contrato de prestação de serviços pode versar sobre o desenvolvimento de atividades principais ou acessórias da contratante”.

No entanto, a Reforma também trouxe salvaguardas. O artigo 5º-C da mesma lei determina que a contratante é subsidiariamente responsável pelas obrigações trabalhistas não cumpridas pela prestadora.

Art. 5º-C. “A contratante é subsidiariamente responsável pelas obrigações trabalhistas referentes ao período em que ocorrer a prestação de serviços, caso a empresa contratada não as cumpra.”

Essa responsabilidade subsidiária foi reafirmada na Súmula 331, item IV, do TST. Nela, continua válido o dever da tomadora em fiscalizar o cumprimento dos encargos trabalhistas.

Outro aspecto relevante é a regra de “quarentena” de 18 meses. O art. 5º-D da Lei Nº 6.019/74 proíbe a contratação de ex-empregados como terceirizados antes de decorrido esse prazo.

Art. 5º-D. O empregado que for demitido não poderá prestar serviços para esta mesma empresa na qualidade de empregado de empresa prestadora de serviços antes do decurso de prazo de dezoito meses, contados a partir da demissão do empregado.”

Tal regra evita a substituição fraudulenta de empregados por prestadores terceirizados, com o objetivo de reduzir encargos trabalhistas.

Que situações não permitem trabalho terceirizado

Apesar da ampla autorização legal, existem situações que inviabilizam a terceirização. E o uso irregular desse modelo pode configurar fraude à legislação trabalhista.

É o caso da chamada intermediação ilícita de mão de obra, quando uma empresa contrata uma prestadora sem estrutura real apenas para fornecer trabalhadores, sem supervisão ou responsabilidade própria.

A jurisprudência reconhece como nula essa terceirização, com base no princípio da primazia da realidade, previsto implicitamente no art. 9º da CLT, que invalida atos simulados que visem fraudar a lei.

Art. 9º. Serão nulos de pleno direito os atos praticados com o objetivo de desvirtuar, impedir ou fraudar a aplicação dos preceitos contidos na presente Consolidação.”

Também é vedada a terceirização quando a tomadora exerce controle direto sobre os trabalhadores, determinando rotinas, aplicando advertências ou controlando jornada.

Esses elementos configuram relação direta de emprego, mesmo que formalmente o vínculo seja com a prestadora. Nesses casos, o vínculo pode ser reconhecido judicialmente com base nos artigos 2º e 3º da CLT, já vistos anteriormente.

Além disso, órgãos públicos não podem terceirizar atividades finalísticas que exijam concurso público.

Outra proibição ocorre quanto à discriminação. A Lei Nº 6.019/74, art. 4º-C, §1º, determina que os terceirizados devem ter as mesmas condições de alimentação, transporte, segurança e atendimento médico oferecidas aos empregados da tomadora.

Art. 4º-C. São asseguradas aos empregados da empresa prestadora de serviços a que se refere o art. 4o-A desta Lei, quando e enquanto os serviços, que podem ser de qualquer uma das atividades da contratante, forem executados nas dependências da tomadora, as mesmas condições: 

I – relativas a: 

a) alimentação garantida aos empregados da contratante, quando oferecida em refeitórios; 

b) direito de utilizar os serviços de transporte; 

c) atendimento médico ou ambulatorial existente nas dependências da contratante ou local por ela designado;

d) treinamento adequado, fornecido pela contratada, quando a atividade o exigir.”

Contrato de trabalho terceirizado

O contrato entre a empresa tomadora e a prestadora de serviços deve seguir critérios formais rigorosos. E a ausência de cláusulas essenciais pode acarretar passivos trabalhistas.

De acordo com a Lei Nº 6.019/74, o contrato deve especificar o objeto do serviço, prazo de execução, número estimado de trabalhadores, valor global e condições de fiscalização.

Além disso, é fundamental incluir cláusulas de:

  • Responsabilidade por encargos trabalhistas e previdenciários
  • Apresentação periódica de comprovantes de pagamento de salários, FGTS, INSS e férias
  • Rescisão por descumprimento contratual
  • Garantias financeiras ou seguros de responsabilidade civil
  • Obrigações relacionadas à saúde e segurança do trabalho

E, por conta disso, se faz necessário exigir mensalmente documentos como:

  • Guia de recolhimento do FGTS (GFIP)
  • Folha de pagamento e comprovantes de depósito
  • CNDs (Certidões Negativas de Débito)
  • Atestados de saúde ocupacional (ASO)
  • Programas de prevenção de riscos (PCMSO e PPRA ou PGR)

Dicas para contratação de trabalho terceirizado com segurança

Empresas que desejam adotar o modelo de terceirização devem adotar práticas preventivas para evitar passivos trabalhistas e garantir conformidade legal. Confira:

Escolha fornecedores idôneos

Verifique o histórico da prestadora, sua capacidade técnica, quadro de empregados e regularidade fiscal e trabalhista. Empresas inaptas oferecem risco jurídico elevado.

Exija documentação periódica

Estabeleça um calendário para apresentação de guias de recolhimento, holerites, CNDs e comprovantes de cumprimento de obrigações. Faça auditorias periódicas.

Evite subordinação direta:
Garanta que a orientação técnica e o controle de atividades fiquem a cargo da prestadora. A tomadora não deve aplicar sanções ou gerenciar diretamente os trabalhadores.

Estenda benefícios coletivos

Ofereça aos terceirizados as mesmas condições de alimentação, transporte e segurança dos empregados diretos, conforme determina a legislação.

Mantenha cláusulas claras no contrato

Especifique responsabilidades, prazos, condições de fiscalização, penalidades e obrigações acessórias. Use modelos revisados por advogados especializados.

Evite recontratação irregular

Respeite o prazo mínimo de 18 meses entre o desligamento de um empregado e sua recontratação como terceirizado, conforme o art. 5º-D da Lei nº 6.019/74.

Treine gestores e líderes

Capacite sua equipe para interagir corretamente com terceirizados, evitando práticas que possam caracterizar vínculo direto de emprego.

Gostou do conteúdo?

Toda semana são pelo menos três artigos como esse aqui no JusBlog. Mas se você curte conteúdos relacionados ao universo jurídico, pode também seguir a Jusfy no Instagram e LinkedIn em @jusfy.