Os direitos da personalidade, apesar de serem um tema central do Direito Civil, possuem amparo direto na Constituição Federal. Em especial no princípio da dignidade da pessoa humana.
Sua proteção jurídica se estende por diversas áreas, com reflexos no âmbito cível, penal e digital.
Por isso, neste artigo abordaremos os conceitos essenciais acerca do tema, com ênfase na definição dos direitos da personalidade; suas principais manifestações; características e interface com o Direito Penal.
O que são direitos da personalidade
Direitos da personalidade são o conjunto de prerrogativas jurídicas inerentes à pessoa humana. Eles visam proteger os atributos essenciais da sua existência e dignidade.
Não possuem caráter patrimonial e são reconhecidos pelo ordenamento jurídico desde o nascimento com vida até após a morte, em algumas ocasiões.
Salvo algumas exceções previstas no Código Civil, os direitos da personalidade são intransmissíveis e irrenunciáveis, não podendo o seu exercício sofrer limitação voluntária.
Sua função é resguardar a integridade do indivíduo em múltiplas dimensões: física, psíquica e moral. Eles formam um escudo de proteção em torno da pessoa, garantindo que seus valores mais fundamentais não sejam violados por terceiros ou pelo próprio Estado.
A base constitucional para essa proteção se encontra no Artigo 1º, inciso III, e no Artigo 5º, inciso X, da Constituição Federal, onde são considerados invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas.
Art. 1º. “A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:
III – a dignidade da pessoa humana;”
Art. 5º. “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
X – são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;
Importante dizer que eles diferem dos direitos patrimoniais, pois não são passíveis de avaliação econômica direta. Contudo, a sua lesão pode gerar o dever de reparação financeira, mais conhecido como indenização por danos morais.
Nós temos aqui no JusBlog um artigo voltado à indenização por direitos morais. Confira:
Indenização por danos morais: como calcular de forma correta
Quais são os direitos da personalidade
O rol dos direitos da personalidade sofre mudanças (ou adições) ao longo do tempo, pelo fato da doutrina e jurisprudência expandirem sua aplicação conforme as novas demandas sociais.
Confira a seguir, aqueles direitos da personalidade mais consolidados no ordenamento jurídico brasileiro.
Direito à vida e à integridade física
O direito à vida é o pressuposto para a existência de todos os demais. Ele abrange não apenas o direito de permanecer vivo, mas também o de ter uma existência digna.
Derivado dele, o direito à integridade física e psíquica protege o corpo e a mente contra qualquer tipo de ofensa ou agressão.
Direito ao nome
O nome, composto pelo prenome e pelo sobrenome, é o principal sinal identificador da pessoa perante a sociedade.
O direito ao nome garante que cada indivíduo seja designado e reconhecido por sua designação civil.
A proteção se estende contra o uso não autorizado do nome alheio em publicações ou representações que o exponham ao desprezo público, ainda que não haja intenção difamatória.
Também se proíbe o uso do nome em propaganda comercial sem devida autorização. O princípio da imutabilidade do nome admite exceções previstas na Lei de Registros Públicos.
Direito à imagem
O direito à imagem protege a representação externa e visual da pessoa. A sua violação ocorre quando a imagem de alguém é captada, exposta ou utilizada sem consentimento.
Além disso, o Código Civil determina que, salvo exceções, a exposição ou a utilização da imagem de uma pessoa são proibidas e passíveis de indenização, se atingirem a honra, a boa fama ou a respeitabilidade.
Direito à honra
A honra se manifesta em duas vertentes: a objetiva e a subjetiva.
A honra objetiva corresponde à reputação do indivíduo no meio social e à percepção que os outros têm de seus atributos.
A honra subjetiva se refere ao sentimento de autoestima e dignidade que a pessoa tem de si mesma.
A violação da honra pode configurar tanto um ilícito civil, passível de indenização por danos morais, quanto um ilícito penal, tipificado nos crimes de calúnia, difamação e injúria.
Direito à privacidade e à intimidade
Embora próximos, os conceitos de privacidade e intimidade não são idênticos.
A intimidade representa a esfera mais secreta e interna da vida de uma pessoa, seus pensamentos, segredos e relações mais próximas.
A privacidade é um círculo mais amplo, que abrange aspectos da vida pessoal e familiar que o indivíduo deseja manter longe do conhecimento público.
A Constituição Federal, como já vimos, garante a inviolabilidade da intimidade e da vida privada.
A proteção se materializa no sigilo de correspondência, de dados e de comunicações telefônicas, exceto por ordem judicial.
Proteção da voz e dos escritos
A voz humana é um atributo identificador da personalidade e sua captação e divulgação sem autorização podem configurar violação.
Da mesma forma, os escritos pessoais, como cartas e diários, são protegidos pelo direito à privacidade e ao segredo.
De acordo com o Código Civil a vida privada da pessoa é inviolável, e o juiz, a requerimento do interessado, deve adotar as providências necessárias para impedir ou fazer cessar qualquer ato que seja contrário a esta norma.
Princípio da personalidade direito penal
No âmbito do Direito Penal, a proteção da pessoa se manifesta através do Princípio da Pessoalidade da Pena, também conhecido como Princípio da Intranscendência. Ele estabelece que a sanção penal não pode ultrapassar a pessoa do condenado.
Este princípio também está previsto no Artigo 5º, porém no inciso XLV, da Constituição Federal:
Art. 5º, XLV. “Nenhuma pena passará da pessoa do condenado, podendo a obrigação de reparar o dano e a decretação do perdimento de bens ser, nos termos da lei, estendidas aos sucessores e contra eles executadas, até o limite do valor do patrimônio transferido”.
Isso quer dizer que a pena privativa de liberdade, a restritiva de direitos ou a multa, devem ser de cumprimento exclusivo do autor do delito. E, em caso de morte do agente, a punibilidade se extingue.
Mas há uma ressalva importante: os efeitos civis da condenação, como a obrigação de reparar o dano causado pelo crime, possuem natureza patrimonial.
Por isso, essa obrigação pode ser transmitida aos herdeiros do condenado, e a execução fica limitada às forças da herança.
Os sucessores respondem pela dívida apenas com os bens recebidos, sem que seu patrimônio pessoal seja atingido.
Características do direito da personalidade
Os direitos da personalidade possuem traços que os separam das demais categorias de direitos subjetivos. Suas características definem o regime jurídico a que estão submetidos.
Inatos: são inerentes à condição humana. A pessoa os adquire ao nascer com vida, independentemente de qualquer ato ou manifestação de vontade.
Absolutos: são erga omnes, ou seja, contra todos. A sociedade e o Estado têm o dever geral de abstenção, de não violar essas prerrogativas.
Intransmissíveis: não podem ser transferidos a outra pessoa, seja por ato inter vivos (doação) ou causa mortis (herança). A tutela de certos direitos do falecido pode ser exercida por seus sucessores, mas o direito em si não é transmitido.
Irrenunciáveis: o titular não pode renunciar a eles de forma geral e permanente. São admitidas apenas limitações voluntárias específicas e temporárias, como a autorização para uso da imagem em uma campanha publicitária.
Imprescritíveis: não se extinguem pelo não uso ao longo do tempo. Uma pessoa não perde o direito à honra ou ao nome por deixar de defendê-lo em alguma situação específica. Já a pretensão de reparação por sua violação está sujeita a prazo prescricional.
Impenhoráveis: não podem ser penhorados para o pagamento de dívidas, por não integrarem o patrimônio do devedor.
Vitalícios: acompanham a pessoa durante toda a sua vida. Extinguem-se, em regra, com a morte do titular. A proteção, contudo, pode se estender para tutelar a memória, a honra ou a imagem do falecido.
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